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Carta Conjuntura Março 2018 – Clube I&F da UFPR

 

Mundo polarizado, país dividido. Que país queremos?

 

PANORAMA GERAL

 

Caro leitor,

 

Começo esta primeira carta conjuntura com um breve panorama sobre os desafios e problemas enfrentados pelo país. Nestes termos, o Brasil precisa urgentemente deixar de ser o eterno “País do Futuro” e realmente criar uma agenda de longo prazo que propicie um ecossistema sustentável de favorecimento ao empreendedorismo e a competição empresarial na esfera privada (aqui destaca-se a necessidade da Reforma Tributária, dos investimentos em infraestrutura e a redução do famoso “Custo Brasil”, a revisão de incentivos a determinados setores e a abertura comercial). Já na esfera pública podemos destacar a necessidade de redução do tamanho do Estado e desburocratização da máquina administrativa, Reforma Política, Reforma da Previdência, Reforma dos Estados... Enfim, o dever de casa é grande e doloroso, e ninguém acha que a tarefa será fácil. Porém, só assumindo o protagonismo de dono de seu destino e fazendo o que precisa ser feito o país da eterna promessa pavimentará uma estrada rumo a tornar-se um país desenvolvido e com real força frente as demais potências internacionais. Pois, para quem não sabe onde quer chegar, qualquer caminho leva a lugar nenhum. Em ano de eleição, fica a reflexão: que país queremos?

 

Neste mês e nos anteriores de um modo geral, percebeu-se o descolamento da economia com a política. Porém, apesar das boas notícias no campo econômico ela ainda apresenta risco substancial em sua trajetória positiva dada a indefinição de questões referentes ao judiciário, ao quadro de reformas urgentes que o país insiste em postergar e que suas discussões provavelmente serão adiadas para 2019 além do risco da incerteza quanto aos presidenciáveis e seus eventuais planos político-econômicos.

 

No cenário internacional verificamos um aparente cessar fogo entre EUA e Coreia do Norte no campo bélico; já no campo do comércio internacional presenciamos o início de uma nova guerra, protagonizada inicialmente por EUA e China e com reverberação nos demais países. Também mantemos atenção quanto a inicial tensão diplomática envolvendo a Rússia, que pode avançar para sanções econômicas.

 

ECONOMIA

 

Selic atinge mínima histórica: O Copom reduziu na última reunião a taxa básica de juros em 0,25%, para 6,5%, e sinalizou que pode prosseguir com nova queda nos juros:

 

“Para a próxima reunião, o Comitê vê, neste momento, como apropriada uma flexibilização monetária moderada adicional.”

 

Sinalizou também que pode ser a última:

 

“Para reuniões além da próxima, salvo mudanças adicionais relevantes no cenário básico e no balanço de riscos para a inflação, o Comitê vê como adequada a interrupção do processo de flexibilização monetária, visando avaliar os próximos passos, tendo em vista o horizonte relevante naquele momento”

 

A decisão de redução da taxa vem embasada em perspectiva de cenário positivo para a inflação brasileira, dada a recuperação econômica, mas que ainda possui forte hiato do produto:

 

“A economia segue operando com elevado nível de ociosidade dos fatores de produção, refletido nos baixos índices de utilização da capacidade da indústria e, principalmente, na taxa de desemprego. Destaque-se, entretanto, que a retomada da economia tem se traduzido em redução gradual dessa ociosidade.”

Inflação revisitada para 2018: O Bacen reduziu a projeção do IPCA de 4,2% para 3,8%, projeção esta que considera um cenário de juros a 6,5% a.a e câmbio de R$ 3,30 ao final de 2018 (Focus). Também manteve-se a projeção de crescimento do PIB em 2,6% para 2018.
 

Redução da taxa de compulsório: Foi anunciada pelo Banco Central a redução de alíquotas de depósitos à vista e de poupança, liberando assim R$ 25,7 bi entre final de abril e início de maio. Espera-se que essa medida, em médio e longo prazo, possa contribuir para quedas nas taxas de juros e dos spreads bancários, dada a redução do custo do crédito. A medida pode ser vista também como mais dinheiro disponível para empréstimos, o que pode ajudar a retomada do investimento no cenário atual.
 

Bolsa sobe no 1º trimestre: a bolsa revelou-se a melhor opção de investimentos no 1º trimestre de 2018. O Ibovespa acumulou rentabilidade real (descontado IPCA) 10,89%, enquanto o IBrX-50 (índice das 50 maiores empresas de valor de mercado) acumulou rentabilidade real de 11,40%. Comparativamente, o IMA-B, que reflete uma cesta de títulos públicos indexados à inflação, teve rentabilidade real de 4,15% e a Poupança teve ganhos de 0,42% (depósitos a partir de 04/05/12).


No front econômico, continuamos mantendo um cauteloso otimismo sobre os rumos da economia brasileira, dado o bom arcabouço macro construído pela Fazenda e o BACEN, com a contribuição de outros ministérios e instituições.
 

Quanto a Selic em específico ela possui um efeito defasado: Selic baixa tende a gerar um câmbio mais alto e melhores condições de crédito ao longo do tempo. Algumas dessas características já estão ocorrendo discretamente.
 

No que se refere ao ciclo de baixa inflação vivido nos últimos tempos a sua continuidade dependerá (entre outros fatores) da taxa de câmbio (dependente de fator externo e risco fiscal nacional). Estas variáveis, principalmente em ano eleitoral e indecisão do novo presidente, prometem para 2019 uma surpresa ao Bacen caso um candidato não Market friendly, que não tenha compromisso com a agenda de reformas necessárias da economia venha a assumir o governo.

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POLÍTICA


Julgamento do ex-presidente Lula: o TRF-4 negou por unanimidade o pedido de recurso da defesa do ex-presidente Lula no processo do Tríplex em Guarujá. Assim, Lula já poderia ser preso quando acabarem os recursos no Tribunal porém, decisão provisória do STF impede a prisão do ex-presidente até que a Corte julgue um pedido de habeas corpus preventivo apresentado pela defesa de Lula. O julgamento está previsto para o dia 4 de abril.


Meirelles renuncia a Fazenda para concorrer às eleições: o ministro Henrique Meirelles deve deixar o Ministério da Fazenda no início de abril para concorrer à Presidência da República. Meirelles deve desfiliar-se do PSD e ir para o MDB nesse movimento. Até o momento o presidente Temer ainda é o mais provável nome do MDB para a disputa eleitoral. O novo nome para comandar a pasta da Fazenda seria Eduardo Guardia, secretário-executivo da Fazenda e indicado para assumir o posto pelo atual ministro.
 

Presidente do BNDES entrega carta de demissão: Paulo Rabello de Castro, atual presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, entregou na última terça-feira sua carta de demissão ao presidente Michel Temer, alegando pretensão em concorrer às eleições presidenciais de outubro. Pela legislação, pessoas que têm cargo no executivo e disputarão a eleição precisam deixar seus cargos até 7 de abril.
 

Incertezas quanto ao cumprimento da lei pelo Judiciário, seu possível viés ideológico e referentes as candidaturas para as eleições à presidência marcarão os próximos meses conferindo certa volatilidade ao mercado.

INTERNACIONAL

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Fim da paz EUA-China: Nas últimas semanas o governo norte-americano elevou as taxas de importação de aço e alumínio em 25% e 10%, respectivamente, sob alegações de necessidade de proteção da indústria por razão de segurança nacional (indústria bélica). A medida prejudica uma série de países exportadores do minério entretanto, já ocorreram isenções para esse aumento (Brasil está entre os isentos). Acredita-se que a medida foi direcionada a atingir principalmente a economia chinesa, que já teve grande diminuição em suas exportações.

 

Outra medida tomada anteriormente pelo governo dos EUA foi a aprovação da Reforma Tributária de Donald Trump, que cortou o imposto de renda de pessoas jurídicas de 35% para 21%, o que estabelece um cenário mais atraente para se investir no país e que na prática gera mais competitividade e estimula a economia. Por outro lado, para a China a reforma é uma grande ameaça, pois há grandes incentivos para os investimentos retornarem aos EUA. Dessa forma, a China pode perder várias multinacionais nesse movimento de possível regresso e, consequentemente, perder força na economia. Para tentar frear este efeito a China elevou as taxas de juros, aumentou o controle de capital e de intervenção cambial na tentativa de manter divisas em seu território e sustentar o Yuan.

 

Estamos presenciando o início de mais uma guerra comercial mundial, onde não se sabe ao certo a duração, a escala e o produto dessa possível nova ordem. A China já apresentou medidas de retaliação como resposta e além disso é a maior detentora da dívida americana (19% do total de $ 6,26 trilhões em débitos com credores estrangeiros). Com este cenário e contrariando Trump, talvez esta guerra não seja nem boa e nem fácil de ganhar...

 

Fed eleva juros e indica novas altas: Sob comando de Jerome Powell, o Fed decidiu elevar sua taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, indo para 1,75%. Os cortes tributários, aumento de gastos e sinais de aumento na pressão inflacionária com perspectiva de alcançar a meta no médio prazo corroboram para que ocorram novas altas no decorrer do ano. O Banco Central americano também elevou as projeções de crescimento da economia sendo agora de 2,7% para 2018 e 2,4% para 2019. No que tange ao desemprego a previsão é de uma taxa de 3,8% para o final de 2018 e 3,6% para 2019.

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Era Putin e crise diplomática: Vladimir Putin se reelege pela quarta vez presidente da Rússia e deve governar o país até 2024. Ele assumiu o primeiro mandato em 2000, foi reeleito, tornou-se primeiroministro e depois retornou a presidência. Sua recente reeleição teve alta taxa de aprovação nas urnas (cerca de 76,6% dos votos) o que demonstra sua aceitação pela população especialmente devido a melhora econômica e pelo seu posicionamento em questões internacionais, o que demonstra uma característica russa de preferência por líderes fortes. Essa reeleição acontece ao mesmo tempo em que os holofotes estão sob o caso do ex-espião russo que foi envenenado na Inglaterra. Como forma de retaliação, 22 países já expulsaram de seu território diplomatas russos (que também pode ser entendido como insatisfação pela continuação de Putin). Por hora ainda não houveram sanções econômicas, mas esse é um ponto importante de se manter no radar.

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Novo Imperador Vermelho: o Legislativo chinês aprovou uma reforma constitucional que permite o atual presidente Xi Jinping permanecer no cargo por tempo indeterminado e converter sua ideologia em parte da lei chinesa, o que dá maior poder ao Partido Comunista. Os defensores da medida estão permeados pelo “sonho chinês do rejuvenescimento da nação” que seria uma narrativa moral aos supostos abusos por parte do Ocidente, o Partido estaria então fazendo justiça e, “finalmente a China será restaurada como uma nação poderosa”. Já os menos favoráveis indicam os perigos da concentração do poder e do quão caótico pode ser o processo de sucessão de poder.

Muro mexicano: o congresso norte americano aprovou no último dia 23 uma verba de US$ 1,6 bilhão destinada a construção do muro que faz fronteira com o México. Uma de suas grandes promessas eleitorais e que reforça o discurso nacionalista, Trump afirmou via redes sociais que “o trabalho começará imediatamente”.

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Vazamento de dados do Facebook: nas últimas semanas foram divulgadas informações de que a Cambridge Analytica (empresa que prestou serviços estatísticos para a campanha presidencial de Trump em 2016) utilizou informações de 50 milhões de usuários do Facebook dos EUA, provavelmente de forma duvidosa e ilegal. A demora quanto ao posicionamento da empresa em relação ao caso só fez piorar a situação, sendo inevitável o despencar do valor da empresa no mercado. Este escândalo põe em dúvida o modelo de negócio baseado no tripé usuário-plataforma-anunciante que tem como base a confiança. Cabe agora a empresa com mais de 2 bilhões de usuários se reinventar e reconquistar a confiança dos consumidores.

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Vários são os casos ao longo da história onde líderes que tinham grande apoio da população, com discursos de hegemonia cultural e propostas nacionalistas (nos seus mais diversos níveis) apareceram. Porém, de maneira geral, as consequências tanto no ponto de liberdades individuais quanto relacionadas à economia não foram tão boas assim. Percebemos potências sem alternância de líderes por muitos anos e que estão tomando medidas nacionalistas economicamente (além do sentimento de retomar a soberania mundial ao qual estão embriagados). Esse cenário prometerá tensões ao longo dos próximos meses...

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DESTAQUES EMPRESARIAIS

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Aquisição da Fibria pela Suzano: em negociação avaliada em torno de R$ 35,7 bilhões, foi anunciada a aquisição da Fibria pela Suzano. A transação ainda precisará ser aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) porém, caso aprovado, cria-se a maior empresa de celulose do mundo, com valor de mercado de aproximadamente R$ 72,7 bilhões e tornando-se nacionalmente a quinta maior empresa não-financeira do Brasil, com capacidade de produzir aproximadamente 11,8 milhões de toneladas de celulose por ano. Segundo dados de 2016 do setor, o Brasil é o segundo maior produtor mundial de celulose com produção de 18,8 milhões de toneladas, ficando apenas atrás dos EUA que foi responsável pela produção de 48,5 milhões de toneladas no mesmo ano. Assim, cria-se mais um campeão nacional (não envolvendo dinheiro do BNDES nessa transação), fortalecendo a presença da indústria internacionalmente.

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CADE aprova compra da XP: o conselheiro Paulo Burnier, relator do CADE que analisa a compra da XP Investimentos pelo Itaú Unibanco, recomendou a compra com restrições visando manter a plataforma aberta da XP. O CADE aprovou a operação por 5 votos a 2. Os conselheiros contrários foram Cristiane Alkmin e João Paulo Resende. Críticos da aprovação consideram o alto grau de concentração bancário fator altamente relevante para impedir a aquisição, manter a concorrência e o bem-estar do consumidor. O Banco Central ainda pode vetar a operação, sendo o seu prazo final até julho.

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Inquérito contra os grandes bancos: Nubank encaminhou uma representação ao CADE que abriu inquérito para averiguar supostas práticas anticoncorrenciais por parte dos bancos Itaú Unibanco, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Segundo pedido de inquérito, os bancos teriam adotado medidas para impedir a entrada e dificultar as atividades de novos agentes no mercado de cartão de crédito.

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O Boticário compra Vult Cosmética: O Grupo Boticário anunciou a aquisição da Vult Cosmética (empresa com apelo jovem e popular). Assim, a empresa passa a ser a segunda maior companhia do segmento de maquiagem do Brasil, com market share de 15%, superando a Natura e ficando atrás da Avon segundo dados da consultoria Euromonitor International.

Alguns dos motivos elencados como estratégicos nesta fusão seriam: a abordagem ao público jovem, atuar em mercados “desconhecidos” ou pouco convencionais (farmácias, estandes em lojas de departamentos, quiosques em aeroportos e estações de metrô) e diversificação do mix de produtos e oferta de itens com preços mais acessíveis.

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Eternit pede RJ: o Grupo Eternit, produtor de materiais de construção, entrou com pedido de recuperação judicial e divulgou o fato relevante em 20/03. Com cerca de R$ 229 milhões em dívidas a empresa alegou além de fatores proibitivos a extração, industrialização e comercialização do amianto variedade crisotila, considerado nocivo à saúde humana, também a deterioração dos fundamentos da economia. Como lição do caso ficam a necessidade de inovação e diversificação, bem como a importância da boa gestão financeira do negócio para sua manutenção.

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Amazon Ultrapassa Google e se torna a segunda empresa mais valiosa do mundo: a gigante varejista norte americana ultrapassou a Alphabet (conglomerado dono do Google) em valor de mercado. Segundo dados da Bloomberg a Amazon vale US$ 768 bilhões, enquanto a Alphabet é avaliada em US$ 762 bilhões. A Apple continua líder, com avaliação de mercado de US$ 892 bilhões e com projeções para alcançar US$ 1 trilhão em até dois anos.

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A grande lição do mês de março é que em uma economia globalizada, a estratégia dominante muitas vezes é a cooperação, pois como num “dilema do prisioneiro” a não cooperação leva a perdas maiores para ambos os lados.

 

Agradeço ao caro leitor pela atenção nesta primeira edição e deixo aqui o convite para as próximas.

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Bons investimentos e até maio!

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Marcelo Takao Tano

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